O Respeito e a importância da Memória.
Morreu um Marinhense meu Amigo.
Conhecemo-nos há muitos anos. Há algumas vidas diria. Ele
Presidente da Junta da Marinha Grande, eu membro da Assembleia de Freguesia da
minha terra.
Tratávamo-nos com cerimónia. Dr. para aqui e dr. para ali. E
assim foi até chegar a campanha eleitoral das autárquicas 2009.
Intensa e maravilhosa campanha essa, onde ambos nos
empenhamos com uma entrega absoluta.
Nesse Verão, exigiu que o começasse a tratar por tu. Estas
coisas, normalmente são difíceis para mim. Alterar uma forma de tratamento após
tantos anos de cerimónia. Com ele não! Curiosamente foi um processo fácil e
imediato.
Partilhamos muitos momentos, muitas reuniões, muitas
decisões, alguns desacordos, onde sempre respeitou a minha opinião, tendo
frequentemente alterado a sua. De uma maneira cordata, com elevação. Com
humildade e com inteligência.
Fomos ficando Amigos. Amigos sim, porque até as nossas
inquietações e incertezas pessoais fomos partilhando.
Era um Homem Bom o Álvaro!
Preocupado, atento e justo.
Abriu a primeira farmácia da Praia da Vieira, que está na
génese da atual Farmácia Moderna de que era proprietário e Diretor Técnico.
Grande mecenas do Grupo Desportivo da Praia. Quantas e
quantas receitas foram processadas sem ter recebido dinheiro, apenas porque
sabia que o doente não o tinha para pagar?
A sua farmácia Moderna foi das primeiras a aderir
à Metadona, numa clara manifestação de preocupação com os tóxico dependentes.
Quantas cadeiras de rodas e camas articuladas ofereceu à comunidade marinhense. Sem espavento nem promoção pública?
Nos Bombeiros da Marinha Grande onde desempenhou um papel ativo
como Presidente da sua Direção, numa época de enormes dificuldades financeiras, com prejuízos evidentes na sua vida
profissional e familiar.
Foi Presidente de Junta, Vereador, Membro da Assembleia
Municipal e finalmente Presidente de Câmara durante 6 anos sucessivos.
Deixou marca profunda na sua comunidade. Marcas que, por
vezes, tão esquecidas têm sido.
Toda a sua vida cívica e política fala por si. Não carece de
qualificativos de qualquer espécie. Basta rever o seu passado e toda a sua entrega.
Antes do 25 de Abril, já tinha opinião. Há tantos hoje em
dia, na efémera ribalta que não podem dizer o mesmo de si próprios. Tantos, meu
Deus!
O Presidente Álvaro Pereira nunca precisou da política
rigorosamente para nada.
Foi traído pela doença. Doença grave e crónica, que o obrigou
a sair de cena dois anos antes do final do segundo mandato.
Ninguém na vida escolhe estar doente. Ninguém!
Há sempre é quem nem isso saiba respeitar e lance as suas
mãos a todas as pedras do caminho para atirar violentamente na cabeça de quem
sofre. E, neste caso, a sofrer muito.
A importância da memória é mesmo essa. Não permitir
branqueamentos, plenos de cinismo de breve conveniência. É essa a face oculta e
negra da ‘política’ e de alguns politiqueiros de medíocres ambições, para quem
tudo vale sempre, desde que lhes garantam um lugar ao sol em futuras
‘contendas’ partidárias.
Quantas mentiras e injustificadas faltas ao respeito foram e
ainda são ditas, nos vãos de algumas escadas mal iluminadas da cidade da
Marinha Grande acerca da saída prematura do Álvaro Pereira da Presidência do
Município.
Houve um dia numa infeliz reunião de Câmara que um famoso
ex-autarca pedindo a palavra ao Presidente Paulo Vicente se lhe dirige nestes
termos: “Exmº Senhor Paulo Vicente virgula Presidente NÃO
eleito”, como quem lhe pretende retirar a legitimidade legal e democrática para
o exercício daquelas funções!
Muita coisa aconteceu depois. Muita água passou debaixo de
muitas pontes.
Ontem, morreu um Homem Bom. Um grande Socialista. Um bom
cidadão.
Importa, porque sempre importa, avivar todas as memórias
breves, que agora se avolumam num enorme coro de carpideiras de circunstância
que tudo fizeram para minorar, atrapalhar, impedir até, que o trabalho dos
executivos do Álvaro ficasse concluído ou em fase de conclusão.
Em vésperas de novas eleições onde o atual executivo se
queixa de falta de tempo e se desculpa constantemente com os anos de gestão
socialista, cumpre dizer, que o Presidente Álvaro entrou na Câmara sucedendo a
um executivo comunista. Houve, tal como agora, uma quebra de ciclo.
A Casa da Cultura foi iniciada e inaugurada. O mesmo tendo
sucedido à obra da Resinagem, à passagem da Creche da Ivima de um
contrato de comodato para a propriedade plena do município, para ai ser instalada uma Creche com 24 horas de funcionamento pleno, ao pagamento
integral ao IRHU (um milhão e trezentos mil euros) para liquidação da divida da construção do bairro de habitação social do Camarnal, disponibilizando de imediato 52 habitações para as famílias carenciadas, às três expansões das linhas da TUMG, à compra e modernização da
sede da TUMG (antigo edifício da EDP, que se encontrava degradado) em pleno
centro tradicional, ao início e fim da negociação da aquisição de todo o
património FEIS, que só não foi assinado por Álvaro Pereira por dificuldades
criadas pelos então Vereadores Aurélio Ferreira e Ana Alves Monteiro, que
deliberadamente atrasaram todo o processo, tendo a escritura de compra ocorrido apenas no mandato posterior.
Escolhi a fotografia que ilustra este texto, pelo enorme
simbolismo que encerra:
Um forte abraço do Álvaro ao Joaquim Vidal. Esta imagem
retrata bem mais que isso, evidentemente, porque foi a última vez que a minha
terra se sentiu abraçada com força, preocupação, reconhecimento e ternura pela
Câmara da Marinha Grande.
Foi reabilitada a estrada que liga a Vieira à sua praia, com
iluminação, passeio, ciclovias e restauro da rede de esgotos, águas e gás, o
início e fim da total recuperação da Rua da Indústria, uma das principais
artérias da Vieira, com passeio pedonal e substituição de todas as
infraestruturas subterrâneas, após uma negociação com mais de 60 moradores, a construção da nova ponte das tercenas que liga as praias da Vieira e do Pedrogão, a
construção da Casa Velório, Saneamento na Passagem e Casal d’Anja.
Este, foi o legado de Álvaro Pereira. Em 6 anos como
Presidente de Câmara!
Um Homem que se entregou anos e anos à causa pública, um político sensível às necessidades dos outros, um Socialista e Marinhense como poucos. Um homem que sempre: "Deu de si, antes de pensar em si".
Lembro os discursos, as entrevistas, as conversas, os
almoços, o sorriso, as lágrimas (que também as houve e muitas), as dificuldades
e os sonhos que sempre pairaram sobre todos nós naqueles anos inesquecíveis!
Até um dia Álvaro.
Por lá para onde fores, existe uma Câmara, uma Junta ou uma
Corporação de Bombeiros Voluntários à tua espera. Estou certo disso.
Até sempre.
Comentários
Enviar um comentário