O Refletório.

 

 


Durante muitas décadas e, até há uns trinta anos, mais ou menos, quase todos os banquetes dos casamentos na Vieira eram celebrados no refeitório da empresa de limas ‘União Tomé Fétèira’.

Quase todo o pessoal, dizia, “o casamento de fulano é no refletório”. Os noivos vêm da Igreja a pé até ao refletório.

O único casamento que assisti por lá, foi muito interessante. Daqui de casa, só o meu pai tinha sido convidado. E, nesses tempos existia uma tradição que era a dos convidados se poderem fazer representar. Foi o caso. O meu pai disse-me assim: “vais tu em minha representação”. Eu devia ter uns 16 anos, nada mais que isso. E, a última coisa que me apetecia fazer era representar o meu pai naquele evento.

Mas, como não tinha alternativa, lá fui.

O espaço era enorme. Encontrava-se dividido por folhas de palmeira, para separar a cozinha da sala de refeições. Eram contratadas imensas cozinheiras. Algumas de primeira água. Cozinheiras, empregadas de mesa, doceiras. Era uma festa grande.

A sala tinha umas 4 filas de mesas corridas com bancos corridos. Cabiam por lá umas 400 pessoas à vontade.

Havia a mesa dos noivos, dos pais dos noivos e dos padrinhos.

Para além da sopa, eram apresentados uns três ou quatro pratos.

Depois aparecia o Zé espanhol, o Zé da Quinta e o Mirão (que tocava baixo, só numa corda e achava-se o maior galã do distrito com o seu bigode tipo Errol Flynn).  

Era o baile que antecedia as sobremesas.

Nesse casamento, houve um pouco de tudo. Eu como era o mais novo do grupo de amigos do noivo, fui-me deixando ficar pela mesa, caladinho e a observar tudo.

Pouco tempo após o trio musical iniciar a sua atuação, aparece uma senhora da cozinha, diz em segredo uma informação ao Zé espanhol do acordeão e entrega um embrulhinho. A música parou e com isso também os casais que estavam a dançar.

O Zé espanhol vai ao microfone com um ar bastante sério e só diz isso: “Minhas senhoras e meus senhores, achou-se uma dentadura que se entrega a quem provar pertencer-lhe”.

E, é quando vinda lá detrás aos gritos de felicidade, uma velhota gorda só diz: “É minha!!!!”

Tinha caído para cima de um dos pratos e devolvida à cozinha para ser devidamente lavada, sem que a proprietária tivesse tido coragem de a reclamar.

Mas que ar de satisfação ela revelava com aquela sinistra descoberta.

Assim, já pode trincar à vontade o bolo dos noivos.

Inesquecível.


Comentários

Mensagens populares