Ainda a propósito do 5 de outubro.

 

A ideia original do Júlio Gouveia, tanto na edificação do Memorial à República/Conhecimento foi, quanto a mim, que acompanhei toda essa maratona nos primeiros 30 km percorridos, notável, original e extremamente necessária.

A Vieira dispõe assim de uma peça escultórica da autoria do artista plástico vieirense, senhor Fernando Crespo, com múltiplos significados. Importantes, todos eles e eternos como é óbvio.

A segunda opção do Júlio, já este ano, foi criar uma tradição de celebrar a República, os seus valores e legado histórico e ideológico em torno desse memorial.

Não estive presente em ambas as circunstâncias, por motivos estritamente pessoais, o que não me impede, de todo, de enaltecer, acarinhar e propalar toda a carga simbólica destes acontecimentos!

Se repararem, a Vieira, tornou-se, novamente líder. 

Pela inteligência, sensibilidade e visão muito para lá do horizonte imediato.

Celebrar a República hoje é quase um ato revolucionário.

Mas urgente.

Necessário. E, absolutamente importante!

Parabéns a todos os que estiveram presentes, tendo-se, dessa forma, associado a esta efeméride.

Como nota final, sublinho que, em todo o país, salvo em Lisboa, é a nossa terra a única que celebra e continuará pelos tempos a celebrar os valores primeiros da República.

A Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade, encontraram um local na Vieira para serem perpetuados.

Só isso, deve-nos deixar de coração cheio e de enorme orgulho.

Até porque essa República que homenageamos, simplesmente já não existe. 

É por isso pois imperioso falar dela novamente.

Abraço Júlio.

 

Partilho agora um texto de 1956, que retrata, infeliz e exemplarmente o estado a que chegamos.

Foi em 1956 que o filósofo judeu alemão Günther Anders escreveu esta reflexão :

′′Para sufocar antecipadamente qualquer revolta, não deve ser feito de forma violenta. Métodos arcaicos como os de Hitler estão claramente ultrapassados. Basta criar um condicionamento coletivo tão poderoso que a própria ideia de revolta já nem virá à mente dos homens. O ideal seria formatar os indivíduos desde o nascimento limitando suas habilidades biológicas inatas...

Em seguida, o acondicionamento continuará reduzindo drasticamente o nível e a qualidade da educação, reduzindo-a para uma forma de inserção profissional. Um indivíduo inculto tem apenas um horizonte de pensamento limitado e quanto mais seu pensamento está limitado a preocupações materiais, medíocres, menos ele pode se revoltar. É necessário que o acesso ao conhecimento se torne cada vez mais difícil e elitista..... que o fosso se cave entre o povo e a ciência, que a informação dirigida ao público em geral seja anestesiada de conteúdo subversivo.

Especialmente sem filosofia. Mais uma vez, há que usar persuasão e não violência direta: transmitir-se-á maciçamente, através da televisão, entretenimento imbecil, bajulando sempre o emocional, o instintivo. Vamos ocupar as mentes com o que é fútil e lúdico. É bom com conversa fiada e música incessante, evitar que a mente se interrogue, pense, reflita.

Vamos colocar a sexualidade na primeira fila dos interesses humanos. Como anestesia social, não há nada melhor. Geralmente, vamos banir a seriedade da existência, virar escárnio tudo o que tem um valor elevado, manter uma constante apologia à leveza; de modo que a euforia da publicidade, do consumo se tornem o padrão da felicidade humana e o modelo da liberdade.

Assim, o condicionamento produzirá tal integração, que o único medo (que será necessário manter) será o de ser excluído do sistema e, portanto, de não poder mais acessar as condições materiais necessárias para a felicidade. O homem em massa, assim produzido, deve ser tratado como o que é: um produto, um bezerro, e deve ser vigiado como deve ser um rebanho. Tudo o que permite adormecer sua lucidez, sua mente crítica é socialmente boa, o que arriscaria despertá-la deve ser combatido, ridicularizado, sufocado...

Qualquer doutrina que ponha em causa o sistema deve ser designada como subversiva e terrorista e, em seguida, aqueles que a apoiam devem ser tratados como tal ′′

 

Günther Anders  

′′ A obsolescência do homem ′′ 1956


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