“Juntem-se aos bons”.
Até entrar na Universidade fui sempre um aluno excelente.
Nunca fui ‘marrão’, mas era um puto organizado e como sempre tive uma memória
brutal, se estivesse com atenção concentrada nas aulas, saía-me sempre muito
bem no final dos trimestres.
A minha mãe, professora do ensino primário da velha guarda,
nunca me perdoaria nem desatenções, e muito menos notas médias. Era muito
exigente. Sempre foi a minha encarregada de educação, daquelas que
frequentemente marcavam reuniões com a diretora de turma.
Um dia, ao entrar no ciclo, atualmente Escola Padre
Franklin, resolve, ingenuamente perguntar ao saudoso Senhor Soares, que, como
se chamava naquele tempo, era contínuo, se eu me portava bem. Obteve a resposta
que nem nunca imaginou, nem queria imaginar. “Parece que o filho da D. Nela é
muito bom aluno, mas cá fora no recreio é tão bandido como os outros!”.
Ainda hoje acho que foi bem feito. Quem é que a mandou
exceder as suas ‘competências’ e fazer tão disparatada pergunta com uma resposta
tão óbvia como evidente e esperada! Adorei.
Vem esta história a propósito, de nunca ter sido, em idade
alguma um modelo a seguir de bom comportamento (fora de portas).
Tive uma educação esmerada. Sabia estar em todos os
ambientes de uma maneira irrepreensível. Agora, quando me sentia à solta, era
tão malcomportado como todos os meus amigos.
Quando acabei o ciclo, a Escola Secundária, que só existia
até ao nono ano, funcionou durante anos em volta da Igreja, numas salas pré-fabricadas
construídas no adro e noutras pequenas salas espalhadas pelo centro da Vieira.
Quando estava a lavar os dentes, ouvia distintamente a
campainha a tocar a chamada. Acelerava, engolia um copo de leite e ainda ia a
comer uma sandes de manteiga a atravessar a estrada.
Como todos devem calcular, o melhor eram os intervalos e o
paraíso atingia-se às sextas feiras, quando terminava a última aula.
Nos intervalos durante toda a semana jogávamos às
balizinhas, que mais não era que jogar à bola no Largo da República, sem guarda
redes, porque as balizas eram os bancos de jardim. Um em frente à pastelaria,
outro em frente ao adro.
Às sextas, era diferente.
Encontrávamo-nos todos, uns 16, depois do jantar, para
jogarmos até fartar.
Nessa altura, na Vieira não havia GNR. Era mesmo a PSP e
tinha entre os seus guardas um tipo completamente doido que ainda é vivo e se
chama ‘Carrega Rosa’. Um louco furioso, cujo principal ‘divertimento', era
apanhar os putos a jogar no largo, roubar a nossa bola e cortava-a com uma
faca.
Quando estávamos cansados de jogar, um de nós ia ao Café
Liz, telefonar para a PSP, tipo por volta das 23 h, a denunciarmo-nos a nós
próprios. Só pelo imenso prazer de fugirmos ao Carrega.
A nossa estratégia era sempre a mesma. Quando ele aparecia a
acelerar em frente ao Cinema vindo num VW carocha azul e branco, quem estivesse
mais próximo da bola chutava-a com toda a força para a igreja e fugíamos todos
para lá.
Era uma adrenalina brutal.
Ainda hoje penso, que não há maior divertimento que ser puto
e fugir à polícia.
Uma noite dessas lá aparece o Carrega e nós a fugir à maluca.
O Hugo, que por acaso jogava muito bem, era o mais pequenino
de nós. Resolve fugir para a igreja e subir para um telhado de uma das salas de
aula. A sala 2.
O Carrega reparou no esconderijo do Hugo. Era um homem alto
e gordo. E resolve começar a gritar: “desce! Se não desceres eu subo” E o
Huguito, coitado põe a cabeça de fora das telhas e só diz isto ao gordo do
polícia: “Você pode subir à vontade, mas se subir eu desço!”
Muita vez fizemos isso e posso assegurar pela saúde dos meus
meninos, nunca esse energúmeno nos cortou nenhuma bola aos bocados.
Um domingo de verão, aterrou um helicóptero
no meio do largo. Era uma emergência e tinham de ir à farmácia buscar uns
medicamentos para um veraneante.
Eis que surge o Carrega de mota, com um bloco de notas na
mão e começa, assim com o peito todo inchado a dar voltas ao helicóptero para o
multar. Não conseguiu, não encontrou a matrícula.
É por estas e outras que sempre gosto de pensar a Vieira
como a aldeia do Astérix.
Irredutível e completamente cheia de gente doida. Onde me
incluo, naturalmente.
Na rua da Fonte Santa, a seguir ao sindicato dos metalúrgicos
havia e há uma travessa, que naquela altura estava muito mal iluminada. Lá ia
eu, o Marco, o Luís Cláudio, de noite, com umas pequenas lanternas a pilhas que
púnhamos debaixo do queixo e fazíamos uhuhuhuhu a quem passasse.
A visão era horripilenda. Uma vez a Célia passou, foge aos gritos e teve de ir à D. Emília que era a bruxa da Vieira, que lhe disse que aquilo tinham sido antepassados dela com problemas para subir ao Céu e ainda andavam por cá.
Não havia ninguém melhor que ninguém. Éramos todos maus.
Mas éramos livres.
Tocávamos às campainhas e fugíamos para trás. Continuávamos
a andar calmamente e quando o dono da casa aparecia à porta perguntava sempre: “vocês
viram quem tocou à campainha?” e nós: “foram uns putos que fugiram, mas não os
conhecemos”.
Naquele tempo, ainda existiam muitos carros de bois. Saltar
para cima dos carros de bois e conseguir andar uns minutos sem o dono que ia a
pé ver era um gozo tremendo.
Mas, ………. Os carros de bois tinham uma particularidade
interessante. As enormes bostas que ficavam na estrada.
Num carnaval qualquer, encontramos uma bosta magnífica
frente à montra da pastelaria.
Carnaval significava ‘bombas de carnaval’ compradas no Farto
a 10 tostões cada uma!
Lembrei-me de fazer uma bomba. Colocamos muito delicadamente
a bomba na bosta. Só com o pequeno pavio de fora. Depois um fósforo em cima do
pavio, uma lixa pfffffffffffffffffff fugia tudo e PUMMMMMMMMMMMMMM. Montra da
pastelaria toda, ... enfim ……!
Passamos a chamar a essa invenção 'bombas de merda'.
Fizemos muitas. O problema é que só podíamos fazer tudo de
noite, porque tal como hoje a Vieira sempre teve muitos bufos. E nós éramos
muito bem comportadinhos e dispensávamos acusações, muito menos ‘infundadas’.
Gosto muito deste meu blogsinho.
E hoje, ouvi e li umas frases soltas que me deram vontade de vomitar.
Vai-me parecendo que incomoda alguns. Coitadinho deste blog.
Só que ainda está para nascer quem me impeça de escrever, pensar ou dizer o que
me apetece. Desde que seja absolutamente verdade.
Como é óbvio.
"Juntem-se aos bons."
Valter Oliveira
Por um PS UNIDO e forte!
😇🙅😏😌🙈🙉🙊👻👽
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