Até as guerras têm a suas regras.

 


Regressado das minhas miniférias em Tavira, encontrei a casa indescritivelmente desarrumada, suja, com muita louça por lavar, casa de banho totalmente indiscritível. Quando tentei apurar responsabilidades, para começar a fazer de juiz de instrução, deparo-me com trocas de argumentos perfeitamente insuportáveis entre o João e o António. Assim do tipo: “este prato eras tu que tinhas de lavar” versus “e este garfo eras tu”.

Não tenho paciência nenhuma para estas trocas de galhardetes de mandriões, desorganizados e xico-espertos.

Corri com toda a gente da cozinha e comecei a lavar louça, de uma forma metódica, porque até gosto dessa tarefa. Pôr no lixo o que a ele pertencia. Tirar umas 9 garrafas de água de litro e meio vazias do chão da sala, pacotes de bolachas vazios, enfim.

Fazia tudo isso quando estavam ambos a trabalhar, para não me irritar a cada prato que lavava.

E, ficou tudo em ordem novamente.

Quando me candidatei ao BCP, coloquei duas moradas, para ter mais probabilidades de entrar no banco. Uma em Lisboa outra na Vieira.

Fiquei em Lisboa, na Nova Rede da Praça Camões no Chiado, como ‘caixa’.

A Luizete e a BIP estavam na Vieira. Já eu, levantava-me todos os dias às 6.30h, tomava o pequeno almoço em casa, como, de resto sempre fiz. Porque esta refeição consegue ter dois atributos: é a mais cara de todas, quando tomada fora de casa, já o contrário também se verifica: quando tomado em casa, o pequeno almoço é a mais barata das refeições.

Hábito antigo. Só nunca dispensei o café, por me ‘levar’ a um momento mágico, maravilhoso e quase esotérico, que é o primeiro cigarro do dia.

Entrava no banco às 8.00h (30 minutos antes de abrir as portas) e como era o mais novo, tinha de varrer o chão da zona das ATM’s, fazer a sua manutenção após um fim de semana no Bairro Alto após  centenas e centenas de levantamentos. Depois sentava-me no meu banco de caixa, sem máquinas de contar notas e muito menos ‘dispensadoras de notas’ para fazer pagamentos. Se, no final do dia houvesse algum erro, lá tinha eu que ‘inchar’ como se dizia. O que, na prática significava ter de pagar a diferença do meu bolso.

Após duas semanas de trabalho, pedi transferência para a área de Leiria, assim de uma forma, própria de quem tem vinte e poucos anos, ou seja, “ou vou para Leiria ou despeço-me”. O diretor da Nova Rede limitou-se a responder: “então despeça-se”.

Não só não me despedi, como aprendi uma lição enorme. Só devemos comprar guerras que sabemos que podemos ganhar. Embora, para a minha forma de ser e de estar continuei a não saber distinguir muito bem esses dois tipos de guerras, porque sempre sentia que podia ganhar todas as que me propusesse lutar.

Continuo assim. Um bocado mais refinado, é certo, mas continuo a pensar que quando temos a razão do nosso lado, ganhamos sempre. O que por vezes não é verdade.

Aquela sucursal tinha o melhor e o pior. O engraçado é que ambos aconteciam simultaneamente. Nos últimos 4 dias de cada mês. Tomava o pequeno almoço pelas 6.30 h e só almoçava pelas 17.30h. Eram os dias de pagamento de ordenados. Naquele tempo era assim. Pagar cheques.

A parte boa era que todas as modelos da ‘Central Models’ vinham (em carne e osso) levantar o ordenado. Foi aí que aprendi a acelerar atendimentos, só para me calhar a modelo que vinha a seguir, onde, como é óbvio, o atendimento, demoravaaaaaaaaaaa imenso tempo.

Aquela sucursal era muito sui generis. Uma vez atendi a Helena Sacadura Cabral. Tinha errado as contas no talão de depósito e eu, armado ao pingarelho resolvo dizer isto, literalmente: “como é que uma das maiores economistas deste país se consegue enganar numa conta de somar tão simples?”. Ela riu-se muito, com aqueles olhos semicerrados de estar a achar piada e depois muito coquete estendeu-me a mão para eu beijar e só disse: “o menino tem razão, mas já estava tão cansada ontem à noite que nem reparei” e continuou a rir.

Outra vez atendi a mãe da Catarina Furtado, que abre a carteira e eu vejo uma foto da filha e só murmuro: “olha a Catarina”. Ela imperturbável, só queria aplicar o dinheiro da filha e quase nem uma palavra disse.

Era uma mulher muito gorda e desengraçada. Tinha uns olhos verdes fabulosos. Devia ter sido uma mulher linda em tempos idos. Mas era distante, parecia fria e com cara de frete.

Numa manhã, daquelas de fim de mês estava eu a deliciar-me a depositar com toda a lentidão do mundo um cheque de uma modelo e, de trás da fila aparece-me um merdas a fazer esta ‘simples’ pergunta: “você por acaso conhece o Dr. Filipe Pinhal? É que eu sou seu amigo pessoal e se você não me atender nos próximos minutos vou fazer queixa de si”. Primeiro fiquei aterrado. Depois pensei assim: não serei eu a atender este fdp. Éramos três caixas e fiz tudo para o mandar para outro colega. Não lhe disse nem uma palavra, mas ‘recusei-me’ a atender tão prepotente e infeliz criatura. É verdade, o Dr. Filipe Pinhal era o vice presidente do BCP, que ficou, anos mais tarde, inibido de praticar atividade bancária por manifestos procedimentos sem qualquer ética empresarial.

Hoje estou particularmente feliz, porque acabei de ganhar uma guerra antiga de 13 anos. Difíceis 13 anos. Acabaram hoje. Ganhei. Estou mesmo feliz por isso. Não é que tivesse dúvidas acerca do seu  resultado final, só estava era farto de tanto ano com prejuízos financeiros imensos, que agora desapareceram num ápice.

Por outro lado, lembro-me de que todas as nossas guerras devem ter regras. Regras básicas. Já basta a brutalidade, por vezes totalmente evitável, da maioria de todos os confrontos.

Lembrei-me disso, porque estou totalmente empenhado numa pequena batalha que eu e todos os que se regem pela mesma opinião iremos brevemente enfrentar. Não me parece de forma nenhuma, que a outra parte cumpra com todos os até mesmo apenas alguns dos deveres elementares de qualquer contenda, que é o respeito pela verdade e pela coerência. De pensamento, de memória e de postura.

Por isso, aqui deixo o aviso. E, não deixa de ser um aviso curioso. Uma noite, numa ‘reunião de família’, entra um homem na sua casa e grita com toda a gente, que aquela casa não era um bordel. E esclarece quem eram as prostitutas daquela família. Passados poucos meses, dois ou três, começa a defender uma das prostitutas por si nomeada, dizendo o melhor acerca dessa pessoa. Tantas e tantas vezes escrita e descrita dessa forma neste mundo das redes sociais. Tanto por ele, como pelo seu pai.

Lembrei-me apenas de duas coisas, bastante peculiares ambas. A primeira, é que mais uma vez, estou metido numa contenda que irei ganhar certamente. Sem sequer fazer parte do exercito oficial. A segunda, é que em bom português, quem defende e protege as prostitutas tem um nome vulgar de uma de duas palavras: ou são os seus chulos ou mais civilizadamente, nunca passaram dos seus proxenetas.

Nas guerras não vale tudo.

Na política também não. 

Em outubro, a gente vê-se!  


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