António Teodósio.

 


Este homem era um louco.
Se fosse vivo, hoje, teria uns cento e  vinte e três anos.
Quando ia para Aveiro, assistir a um comício do candidato a Presidente da República Norton de Matos, teve um acidente de automóvel e morreu. Relativamente novo, aos 56.
Era o meu Avô António.
Nunca o conheci.
Dele existem, inúmeras histórias. Fabulosas algumas, caricatas muitas e inacreditáveis quase todas.
Republicano e anti-fascista dos quinhentos costados. Correspondente do Jornal 'República', Fundador da Biblioteca da Vieira (que, de resto, nasce de várias conversas com putos universitários da Vieira, daquele tempo, no café liz - o café, cervejaria que inventou); ajudou a fundar os bombeiros, que funcionaram numa garagem sua durante anos.
Nunca foi um homem rico, antes pelo contrário.
Era ateu (segundo dizia) e depois, perdia horas, sozinho, dentro de uma igreja. Houve mesmo alturas em que, por esse motivo, ficou sem transporte para casa porque 'se esqueceu' das horas do comboio ou da camionete.
Na passagem de ano, oferecia a toda a gente que estivesse no seu café, uma taça de champanhe e passas de uva.
Na meia noite, partia uma garrafa de champanhe no balcão e gritava o que não podia ser gritado naquele tempo: "Viva a República, Viva a Democracia, Viva a Liberdade".
Nos dias 5 de Outubro, anos houve, em que foram 'rebentadas' algumas 'bombas' no pinhal, sem ninguém saber quem tinha sido...(Tinha sido ele, e outros malucos como ele, como era evidente). Isto agora parece surreal, naquele tempo não era assim tão linear. Mas foi, durante tantos anos.
Esteve preso, porque tinha posto na montra da sua loja (onde hoje é o Café Liz) propaganda anti-fascista.
De entre tantos episódios que me foram transmitidos da sua vida breve, limito-me apenas a transcrever um:
Uma noite a sua loja foi assaltada por ciganos. Ele e os guardas conseguiram apanhar os assaltantes nas Caldas da Rainha. Quando chegou a casa, a altas horas da noite a minha Avó perguntou como tinham acabado as coisas. A resposta dele foi curta e simples: " Olha, tive tanta pena deles que lhes dei sete e quinhentos e retirei a queixa".
Há tanta, tanta historia deste homem, que carrego nos ombros.
Esteve doente, muito doente, (com uma depressão enorme - naquele tempo não havia nada disso - eram doenças 'da cabeça') quando os irmãos, quase todos, o abandonaram.
Ficou só.
Apenas com a sua família mais próxima, os seus muitos amigos e com a razão que lhe assistia, mas completamente transtornado.
Esta fotografia com mais de 60 anos, lembra apenas, que quando abria a porta traseira da sua velha loja, os pombos, todos os seus pombos, vinham ter com ele.
É por tudo isto e muito mais, que tenho um filho, que se chama António Teodósio Pedrosa.

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