Miguel Sousa Tavares.
Acabei de ver a entrevista ao Miguel Sousa Tavares na RTP 1,
pela Fátima Campos Ferreira, tanta vez ridicularizada pelo seu “Prós e
Contras” do mesmo canal público.
Confesso que sempre gostei do Miguel. Li todos os seus livros.
Alguns, mais do que uma vez. Fiz questão de conhecer a ilha de São Tomé, onde
nunca iria, caso não tenha absorvido com indescritível prazer o seu romance “Equador”.
Desenvolvi e mantenho uma teoria que todos os romances inesquecíveis
têm como máximo denominador comum, o facto de acabarem em tragédia. Veja-se os
Maias, por exemplo.
Não deve ser fácil para ninguém ser filho de pais notáveis,
como foi o seu caso.
Da parte da sua mãe, uma das poetisas mais fascinantes do
século XX e o seu pai, um lutador antifascista, advogado e claro, louco e
destemperado, como poucos.
Quando alguém, ou por isto ou por aquilo se eleva dos demais,
aparecem, quase sempre, corjas de detratores. Normalmente compostos por pessoas
cultas, mas, … essencialmente frustradas, porque nunca se conseguiram elevar
sendo que essa tentativa de elevação, sempre foi, o seu objetivo
primeiro. Esses, por definição, hábito ou cinismo breve farão sempre parte do
grupo das “sardanitas”. Julgam-se cobras, mas, não conseguem chegar a tanto.
Todos nós estamos poluídos e repletos de enormes e múltiplos defeitos. Cada um de nós assim é. Faz parte da nossa condição. Existe, no
entanto, um grupo que se acha mais merecedor de atenção e respeito do que todos
os outros. Esses, em regra, mais não são que simples detratores daqueles que “estão”
na crista da onda. Por mérito próprio, em todos e são muitos os domínios onde
alguém se pode e consegue destacar dos demais.
Vem isto a propósito, de há mais de trinta anos ter ouvido esta frase tida como absoluta definição instantânea acerca de Francisco Sousa Tavares: “Vi-o uma vez, muito bêbado a jogar poker e profundamente malcriado com os outros!”. E pronto. Está definido o homem!
Bêbado, jogador e malcriado!
Nunca me esqueci de tão breve e profundamente lamentável
definição.
Resta dizer que o “definidor”, também jogava poker
frequentemente, também bebia com extrema “generosidade” e também dizia “foda-ses
e caralhos” com elevada abundância. Só não eram nacionalmente reconhecidas as
suas qualidades políticas, profissionais e cívicas que achava merecer possuir.
Enfim.
E isso bastava para alardear tão funesta e original caracterização de um homem notável.
Adiante.
Costumo ultimamente conversar comigo muita vez acerca do facto de me sentir, cada vez mais, “nas tintas”
para a opinião que os outros têm, tiveram ou poderão ter acerca de mim.
Sinceramente.
Já dei para todos esses peditórios.
O Miguel Sousa Tavares marcou uma geração de grandes repórteres
e jornalistas.
Com todas as suas contradições e exageros.
Lembro-me dele em Leiria, na segunda volta das presidenciais em
1986. Estava com um chapéu de feltro preto, de abas viradas para baixo. Eu, era um
puto de 18 anos e achei aquele visual o máximo.
Lembro-me dele, nessas mesmas eleições, a moderar o debate do
século entre Freitas do Amaral e Mário Soares, acompanhado pela enorme jornalista
Margarida Marante. Isto foi no tempo em que os “animais falavam”, quando existiam
jornalistas e políticos de primeiríssima água.
Recordo algumas particularidades como diversas entrevistas
que deu e me foram marcando.
Tudo isto para dizer, uma verdade absoluta: quando se é bom
em alguma coisa neste país – no caso do Miguel e do seu pai, por exemplo – para a maioria de
nós tudo vale, para deitar abaixo. Apenas e só porque existem "alturas" que
alguns nunca alcançarão e, talvez por isso, sintam tanta necessidade em puxar
os outros para baixo, para o lixo, para a lama e para a ralé.
Por inveja, complexos diversos e simples crueldade, para não
utilizar adjetivos piores.
Ter e transmitir a total liberdade de opinião completamente
expurgada de interesses mesquinhos e pessoais, não é, de facto, para toda a
gente.
Para o Miguel Sousa Tavares, isso foi, com razão ou sem ela,
a constância de todas as suas frases e palavras, atos e omissões.
Para a maioria de vós, que nunca folheou, por exemplo, um exemplar
da “Grande Reportagem” ou nunca leu o livro “No teu silêncio”, será muito
difícil de compreender.
Sorte a minha que li, vi e ouvi este homem, grande jornalista
e, já agora, homem de liberdade.
O que, por si só, já vale bem uma vida.
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