Bom aproveitamento.

 


Quando trabalhei no BCP, sempre almocei em pequenos restaurantes. Foi assim em Lisboa no Largo Camões, em Porto Mós, em Alcobaça e finalmente na Marinha.

Alguns restaurantes houve onde tinha a liberdade de entrar na cozinha, destapar tachos e escolher. Evidentemente que mantinha uma relação muito para lá de simpática com a ou as cozinheiras, porque de autênticas cumplicidades se tratavam.

Adorava isso.

Hoje, mantenho esse tipo de relacionamento apenas com duas cozinheiras do mesmo restaurante onde sou cliente habitual. Refiro-me ao “Farto”, na Vieira.

A Dora e a Benilde tratam-me como um menino. O que não significa que nunca me tenham posto a andar da cozinha para fora aos gritos, quando acabo de entrar nos seus domínios e a sala está cheia. Nessas alturas saio de fininho, porque isto de contrariar mulheres que nos tratam bem é sempre uma aventura com desfechos desconhecidos e, diz-me a experiência, quase todos absolutamente evitáveis.

Como me alimento bastante mal, porque vivo sozinho, quando quero comer “civilizadamente” sem recorrer a petiscos caseiros que alimentam o colesterol e os meus queridos e inseparáveis triglicéridos, lá vou eu ao “Farto”. Sempre como sopa, fruta ou um arroz doce F e n o m e n a l, e um prato de peixe ou carne bastante bom e caseiro, como as melhores refeições devem ser.

Hoje, fui lá almoçar.

Mas, não é do almoço, nem da ementa que me apetece escrever. Até porque as circunstâncias são quase sempre as mesmas (mais grito menos grito da Dora ou mais raspanete menos raspanete do Leonel, por causa das obras que entende que eu já devia ter feito há muito em minha casa ou mesmo da forma mais ou menos cuidada em que se encontra o meu quintal e as suas – porque “são” dele – árvores que por lá estão), nada disso me interessa hoje mencionar.

Tive, na minha primeira classe, a D. Cilinha como professora. Hoje estava a almoçar por lá.

Como tinha sido “corrido” pelo Leonel de uma mesa que acabara de escolher para me sentar, lá fui “empurrado” para perto da porta. E, por lá fiquei, sem resmungar, porque não estava com paciência para isso. Há dias assim, para felicidade dele e minha. Simplesmente não estou para o aturar e calo-me, como se tivesse seis anos. Sento-me onde ele manda e fico à espera que a Ana repare que está alguém sentado naquela mesa, como foi o caso de hoje.

A D. Cilinha ia a sair. Tinha acabado de almoçar e veio, como sempre faz, cumprimentar-me.

Levantei-me, beijei-a e ouvi duas coisas que me fizeram bem. Trouxe-as o dia todo comigo.

“Gosto muito de si. Gostava que soubesse que penso, há muito, que o Rui está muito mal aproveitado.”

Fiquei sem jeito, porque não sabia o que dizer. Mas fiquei feliz com aquela opinião da minha professora da primeira classe.

Ainda mais hoje, numa sexta-feira, de uma semana que me deixou ou foi deixando bastante triste. Com mal entendidos, que “pelos vistos” e “pelos lidos” voltam a repetir-se novamente.

Penso, aliás, tenho a mais absoluta certeza que ninguém gosta de ser mal interpretado, porque quando essas circunstâncias ocorrem estão sempre envoltas em injustiças e errados entendimentos. Só me entristecem quando de pessoas de quem gosto muito se tratam. Como é o caso.

Já não tenho é “idade”, paciência, e o mais grave ainda, “vontade” para dissipar dúvidas injustas e a despropósito.

Fez-me bem voltar a casa com as palavras da D. Cilinha na cabeça: “O Rui está muito mal aproveitado”.

Pelos vistos, para a minha professora do primeiro ano da instrução primária, ainda tenho algum “aproveitamento”.

“Fiquemo-nos, pelos sentimentos”, como li esta semana, num post inocente e sem destinatário assumido.

Valha-me Deus, que já não tenho estômago para certas coisas.


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