Manel Branco.
Tudo o que conseguiu ter deu-lhe imenso trabalho, durante
muitos anos. Ajudando sempre a sua família enquanto estudava. Tirou o Curso
Comercial, na escola que eu e o António frequentamos.
Sempre trabalhou para custear os seus estudos e ajudar a
irmã, o seu irmão João, alguns sobrinhos e a sua mãe.
Até ao fim.
Foi uma das pessoas mais generosas que conheci em toda a
minha vida. Aquele tipo de generosidade que se tem apenas pelo prazer de fazer
ou contribuir para fazer os outros felizes. Muitas vezes silenciosa ou
totalmente anónima e discreta.
A minha Mãe foi assim a vida toda.
Hoje, caso fosse viva, deveria rejubilar de felicidade se
soubesse que o seu neto mais velho decidiu (logo hoje), voltar a trabalhar
todas as tardes. Essencialmente por duas razões principais: apenas tem aulas de
manhã, consequentemente tem todas as tardes livres e, quer fazer o programa
Erasmus em psicologia num dos três países do norte da Europa. Suécia, Noruega
ou, quem sabe, Finlândia.
Tem a consciência que será extremamente dispendiosa essa sua
opção académica e, sem dizer, pedir ou conversar com rigorosamente ninguém,
procurou trabalho com o único propósito de ser menos cara a sua opção.
Conheço muito pouca gente assim.
Tive sorte, talvez por ser meu filho. Sinto um imenso
orgulho, quando após ter ultrapassado todas as enormes dificuldades físicas e
psíquicas que o corpo de fuzileiros lhe conferiu numa recruta dura, onde mais
de quatrocentos candidatos tombaram … ele que chegou entre os primeiros 35, resolve
desistir, após ter ultrapassado tudo. Como quem diz assim, “Vocês, não foram
capazes de me tombar. Nunca desisti. Só não me revejo em nada disto. E, já
agora, … até um dia”.
Nessa altura fiquei fulo. Penso mesmo que foi a única vez em
que me aborreci a sério com o Manel. Penso até, que nos aborrecemos todos.
Agora tenho orgulho nessa postura. Foi infantil,
adolescente, imponderado? Sinceramente não sei, nem me interessa saber. Porque
foi uma postura invulgar de tão digna.
Logo depois, arranjou trabalho novamente. Sozinho e sem
ninguém lhe ter dito nada nesse sentido.
Foi, digamos, “director” de reposição de lacticínios nas
prateleiras do Jumbo durante um ano inteiro. Ia a pé durante meia hora, mesmo
que estivesse a chover. Ia e vinha.
Agora arranjou trabalho no Lidl. Não há dúvida que o rapaz
tem jeito para as grandes superfícies. Desta vez é para se custear a si próprio
e aos sonhos que transporta consigo.
A minha Mãe, coitada, se fosse viva diria que não seria
necessário o neto trabalhar com este propósito. Ela lá estaria para pagar tudo
o que fosse necessário. É o que costuma acontecer com as pessoas que se
esquecem, de tão boas que são, de tudo o que foram e fizeram para atingirem os
seus sonhos.
No entanto, há sempre uma dúvida que permanece: será que a
minha Mãe, caso ainda estivesse connosco se teria esquecido ou retido todo o
seu percurso na memória?
Gosto mais de pensar que sim. E, mais uma vez, teria feito tão
somente o que sempre soube fazer: ajudar os outros, tivessem sido os seus
netos, os seus alunos, os seus irmãos ou seja lá quem fosse.
Pensei muito nela hoje. Por tudo o que escrevi e também,
porque hoje foi o dia em que morreu a Mãe do meu maior e melhor Amigo de uma
vida inteira. Aquele que ofereceu o seu nome ao meu filho mais velho.
Grande Abraço, Manel.
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